14 REVISTA LOCAÇÃO – Qual a previsão da Cox para o mercado de usados nos próximos meses? Será um 2022 muito parecido com 2021? ANA RENATA – A gente está ainda vivendo uma fase complicada. Com a pandemia, o mercado de usados apresentou grandes transformações. Houve uma paralisação mundial na indústria, não apenas na automotiva. O que aconteceu é, de certa forma, algo que seria impensável para muitos que acompanham esse mercado. Foi uma mudança estrutural. O mercado automotivo no Brasil gira em torno de 20 milhões de veículos por ano e a maior parte desse volume, cerca de 80%, é formada por usados. Os dois segmentos estão unidos, o mercado de novos alimenta o de usados, na medida em que estes são dados como entrada na compra dos novos. Seminovos, com até três anos de uso, chega a ser um negócio maior do que o de novos nas concessionárias. É uma unidade de negócios que, muitas vezes, fatura ou sustenta mais a operação do que os novos. Então é muito importante se atentar para a recuperação desse segmento. Ocorre que tudo está interligado. Com a falta de produção de carro zero, a indústria deixa de abastecer a concessionária. Assim, o estoque da concessionária fica em baixa, e o mercado recorre ao seminovo para atender à demanda não-suprida pelos novos, como alternativa. Com o aumento na procura dos carros, maior do que o normal, os preços subiram abruptamente, e esse cenário continua o mesmo neste ano, porque as fábricas já adiantaram que não conseguirão voltar rapidamente aos patamares de produção pré-pandemia. Alguns analistas acreditam que isso só ocorrerá em 2024. Mesmo que as fábricas retornem com força máxima e em três turnos, não será possível atingir a produção de antes da pandemia, pois faltam componentes, principalmente semicondutores. Os microchips usados pela indústria automotiva são os mesmos comprados pela indústria eletroeletrônica. Elas brigam pela mesma matéria- -prima, o que explica a escassez. RL: E o mercado brasileiro não está imune a isso, correto? Qual a perspectiva de retomada no mercado interno? AR – O mercado brasileiro é, de fato, muito resiliente. Pode ser que haja uma recuperação mais rápida. A própria Anfavea conta com um crescimento em 2022, ainda que modesto. Os primeiros sinais disso já foram observados. Temos uma população compradora de veículos, muito ativa. O Brasil recuperou sua sede de compra de carros rapidamente, mas falta carro. A aguardada normalidade no abastecimento do novo terá um impacto em toda a cadeia. No entanto, ainda estamos longe de recuperar a média de 3,5 milhões de veículos por ano que a gente já produziu. De qualquer forma, as montadoras estão se estruturando para a retomada. Entre as previsões apocalípticas e as mais otimistas, eu arriscaria que as vendas do mercado automotivo possam crescer entre 9% e 9,5% este ano, incluindo novos e seminovos. RL – Qual é o papel das locadoras nessa equação? AR – Com suas frotas, as locadoras são um elemento muito importante para abastecer o mercado de usados, mas hoje, como todo mundo, enfrentam dificuldade para adquirir ativos. Falta carro zero no mercado. Portanto, hoje o inventário das locadoras tem uma tendência a ser alongado. As locadoras não podem se desfazer de seus seminovos sem ter a contrapartida de comprarem veículos novos, sob pena de não conseguirem alugar. Nesse momento de escassez de novos, é preciso gerir a frota de maneira estratégica para equalizar o que pode ser liberado para desmobilização e o que fica para o aluguel diário. RL – A oferta de crédito preocupa? AR – Sim, o crédito é uma das preocupações. O nível de financiamento dos veículos ainda é baixo no Brasil: 30% apenas, considerando que metade dos novos é financiada e somente 25% dos usados são adquiridos com a ajuda do financiamento. Os bancos preferem não correr risco. Eles deveriam oferecer novos modelos de contratação de crédito. E a entrada de novas instituições financeiras no mercado é bem-vinda. Entrevista "TEMOS COMPRADORES, MAS NÃO TEMOS CARROS. TAMBÉM FALTA FINANCIAMENTO"
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