Revista Locação 93

9 Revista Locação: Como será o próximo ano para as locadoras e a economia em geral? Gesner de Oliveira: Qualquer previsão que se faça agora sobre 2021 será de alto risco. As projeções para o Brasil com a pandemia eram as menos oti- mistas possíveis. Mas o apocalipse não veio. Em 2019, todas as grandes economias do mundo estavam com taxas de crescimento positivas, inclusive o Brasil. Tínhamos uma expectativa de crescer de 2% a 3% este ano. A reversão dessa expectativa foi muito forte. Estamos aguardan- do um cenário de queda na economia de -5,5%, o que, comparativamente ao fim do mundo an- teriormente previsto, é um número razoável, apesar de ser a maior contração econômica já registrada no Brasil. Passamos pela tormenta. O importante agora é as empresas se prepararem para diferentes cenários traçados para 2021. RL: E quais são esses cenários? GO: Um desses cenários, pessimista, é de reces- são forte e continuidade do problema fiscal, com déficit primário, ou seja, a diferença entre receitas e despesas, da ordem de R$ 900 bilhões. Isso é preocupante. Temos fragilidades fiscais, um dese- quilíbrio nas contas públicas. A demanda do pa- cote antipandemia por parte do governo agravou essa dívida. Precisamos de reformas econômicas mais profundas para superar esse déficit. RL: Não há retomada à vista? GO: Sim, alguns segmentos já demonstram recupera- ção. Setores como o agronegócio, por exemplo, que demonstroumuita capacidade de resistir à crise. A in- dústria da construção foi bemnesse período. O varejo também apresentou uma recuperação relativamente rápida, assim como a indústria. O varejo eletrônico foi um exemplo de adaptação rápida aos meios digitais durante o isolamento social. Há setores com boas perspectivas de recuperação, como o da saúde e nu- trição. A situação complica um pouco para o setor de serviços, cuja recuperação é mais lenta. São ativida- des mais afetadas pela política de isolamento social. As locadoras certamente foram impactadas pela res- trição de circulação de pessoas. Mas, de modo geral, a economia está deixando o sinal vermelho. RL: E o setor automotivo? GO: Esse setor especificamente sofreu muito nos úl- timos meses. Houve uma grande queda na produção e também em vendas. A recuperação aqui é recente. Existe até um gargalo hoje na oferta de veículos. RL: Do que o Brasil depende para uma recuperação mais acelerada? GO: O setor de infraestrutura será decisivo para a retomada. Há um grande apetite por investimen- tos nessa área, em segmentos como o de sanea- mento, por exemplo, ou o do 5G, na telefonia. São investimentos com grande efeito multiplicador sobre a economia e a geração de empregos. Mui- tos deles precisam da segurança jurídica que está sendo regulamentada no Legislativo. Existe ain- da um conjunto de reformas sendo avaliadas no Congresso que são de grande importância, como a tributária. O próprio governo trabalha com dois cenários para o próximo ano: com e sem reformas. Sem reformas, o crescimento será conservador. A longo prazo, com as reformas, o crescimento mé- dio projetado até 2031 é de até 4% ao ano. RL: Como ficam as taxas de juros? GO: Continuaremos com juros baixos. Aliás existe uma oportunidade de crescimento com a alta taxa de câmbio aliada à baixa taxa de juros. Isso leva ao estímulo às exportações, num momento em que a China, única economia do mundo que ainda cres- ce, continua sendo importante parceiro comercial do Brasil. Com tudo isso, crescer 3% em 2021 é algo razoável. Não será o suficiente para recupe- rar o nível pré-pandemia, mas representa uma re- cuperação significativa. RL: O cenário internacional, influenciará no Brasil? GO: Sem dúvida. Há ainda que se considerar o impacto da eleição nos Estados Unidos. O quadro continuará marcado pela rivalidade tecnológica de China e Estados Unidos, pelo protecionismo. As relações internacionais com o Brasil estão sendo pautadas pelo meio ambiente. RL: E a inadimplência, preocupa? GO: Analisando pesquisa realizada pelo IBGE, ve- rificamos que infelizmente pequenas e médias empresas tiveram muita dificuldade no acesso ao crédito este ano. O dinheiro não chegou a tempo e em quantidade para resolver os sérios proble- mas de liquidez que as empresas enfrentaram. Em alguns segmentos, esse problema vem se prolon- gando. Quem já estava preparado para o comércio eletrônico suportou melhor a crise. Mas outros não estavam nesse estágio. A possibilidade de termos uma continuidade nesse quadro de problemas em solvência no próximo ano é grande. O gestor preci- sa estar atento a esse risco de crédito. RL: Para finalizar, um recado para as locadoras que estão em busca de oportunidades. GO: A médio prazo, teremos uma mudança nos trajetos e no transporte. O teletrabalho levou as pessoas a entenderem que elas podem eventu- almente trabalhar fora dos escritórios. As restri- ções a voos internacionais e viagens mais longas é outro fator advindo da pandemia. As pessoas vão preferir trajetos e viagens mais próximos. As- sim, o veículo leva vantagem em relação ao avião. A longo prazo, espera-se uma mudança de menta- lidade sobre a mobilidade em geral. Entrevista

RkJQdWJsaXNoZXIy NDU0Njk=